Para os pais, o trauma emocional de ver um filho doente ou
se machucar equivale a vivenciar uma guerra. Uma doença infantil grave pode lançar uma sombra muito
pesada sobre a família, muitas vezes, por anos após a crise ter passado.
Uma mãe se sentou em nossa clínica, recentemente, chorando
porque o filho mais velho estava com problemas na escola. Ela se culpava.
Anteriormente, o filho caçula adoecera com gravidade, e a mãe achava que tinha
sido tão consumida pela preocupação –à época e desde então– que cometeu erros
criando o mais velho. Ela insistia que os resultados foram problemas
comportamentais e escolares, e não se deixava convencer do contrário.
Eu me perguntei se ela estava perturbada, ao menos em parte,
porque a internação do caçula ainda a assustava –ainda que a criança, agora
plenamente recuperada, estivesse correndo pelo consultório. Ou talvez –só fui
pensar nisso mais tarde– a mãe se lamentasse porque qualquer cenário médico,
com médicos, enfermeiros, cheiros e visões hospitalares, desencadeavam emoções
intensas.
Os pais podem se ver assombrados por uma doença ou ferimento
de um filho. No momento, eles são confrontados pela verdade apavorante de que
um filho corre perigo ou sofre dor. Quando as respostas ao estresse normal dos
pais causam esgotamento em casos extremos –e quando continuam muito além da
enfermidade do filho– um prejuízo adicional pode advir sobre a família. O
trauma emocional da experiência, no caso dos pais, o equivalente a vivenciar
uma guerra, pode ecoar durante anos.
Pesquisadores que estudam o estresse parental costumam
recorrer à metáfora da máscara de oxigênio: se você não respirar, não será
capaz de cuidar de seu filho.
"Os pais precisam se sentir bem o suficiente para dar
assistência ao filho doente e aos outros", disse Nancy Kassam-Adams,
psicóloga que dirige o Centro de Estresse Traumático Pediátrico do Hospital
Infantil da Filadélfia. "A pior parte é cuidar de si mesmo."
SAIBA COMO DISCIPLINAR O SEU FILHO DA FORMA CORRETA
Kassam-Adams é a principal autora de uma nova análise a
respeito do estresse pós-traumático em crianças e pais depois de um ferimento
infantil, cuja conclusão é a de que uma a cada seis crianças, e uma porcentagem
parecida de pais, vivencia sintomas significativos e persistentes. Eles podem
ter lembranças e sonhos inoportunos ou continuar evitando pessoas ou lugares
que recordem as circunstâncias do ferimento ou enfrentar problemas de humor,
como a depressão. Sem tratamento, isso pode prejudicar a recuperação física e
emocional da criança.
As pesquisas a respeito dos efeitos do estresse parental
surgiram enquanto o tratamento do câncer pediátrico resultava em mais e mais
histórias de sucesso, vitórias médicas que devolveram as vidas às crianças.
Assistentes sociais e funcionários das clínicas –além dos pais em si– começaram
a fazer perguntas sobre como ajudar as famílias a tocar o barco com essas
infâncias recuperadas de forma triunfal.
O que ajudou, em parte, foi dizer aos pais que eles foram
alistados em uma guerra, afirmou Anne E. Kazak, psicóloga pediátrica e
codiretora do Centro de Ciências da Saúde Pública, do Sistema de Saúde
Pediátrica Nemours, de Wilmington, Delaware. Os pais se identificavam com essa
metáfora: "Vocês foram parte da guerra contra o câncer, lutando a
batalha".
Parte das estratégias e descobertas obtidas com esse corpo
de pesquisa é visível na maioria dos hospitais infantis: um lugar para os pais
dormirem, mesmo na unidade de tratamento semi-intensivo, inclusão dos pais nos
círculos centrados na família e equipes afinadas em interpretar um
comportamento extremo de um pai como um grito de ajuda, e não uma fonte de
irritação e de trabalho dobrado.
Porém, o que acontece depois que as crianças saem da zona de
perigo médico? Muitos pais continuam a vivenciar os sintomas físicos do
estresse, como pulso acelerado e boca seca. Eles ficam se lembrando do momento
do diagnóstico de câncer, do instante do nascimento prematuro e da hora do
acidente.
"Para mim, um pai traumatizado sempre está à espera de
outro acontecimento, sempre de olho no horizonte", afirmou o médico
Richard J. Shaw, professor de psiquiatria na Stanford.
Veja ideias de atividades físicas para pais e filhos
fazerem juntos
GOOGLE IMAGES |
Consultoria: Ricardo Barros, pediatra e coordenador do grupo
de trabalho em medicina esportiva da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria);
Rodrigo Assi, preparador físico pós-graduado em fisiologia do exercício e
fisioterapia no esporte; Joel Conceição Bressa da Cunha, pediatra do
Departamento Científico de Saúde Escolar da SBP; Luís Fernando Taioli,
professor de natação infantil da Academia Competition, em São Paulo, e Lucas
Buendia, professor de esportes da Academia Competition Orlando/UOL
Segundo artigo publicado, neste mês, na
"Pediatrics", Shaw e colegas demonstraram que uma simples intervenção
preventiva poderia reduzir de forma significativa os níveis de estresse
traumático e de depressão vivenciados pelos pais de bebês prematuros na UTI.
Sabe-se que tais pais –observando os nenéns tão minúsculos lutando em um dos
ambientes mais perturbadores e de alta tecnologia da medicina– correm um risco
elevado de sintomas de estresse severo, como pesadelos e crise de ansiedade.
"A esperança para o nosso estudo era que pudéssemos
reduzir o trauma e a ansiedade dos pais e assim ajudá-los enquanto os filhos
vão crescendo", explicou Richard Shaw.
Ele e seus colegas usaram muitas técnicas da terapia de
comportamento cognitivo. Os pais descobriram maneiras pelas quais o estresse
costuma se manifestar e modos para lidar com ele, como o relaxamento muscular.
Eles também aprenderam formas de compreender e descrever o que lhes acontecia.
"Técnicas de reestruturação cognitiva ajudam as pessoas
a reinterpretar e prestar atenção no positivo, sem descambar na catástrofe,
desenvolvendo uma narrativa do trauma de sua experiência", disse o
psiquiatra Shaw.
Um recado para os médicos é perguntar sobre a doença
passada, e sintomas possivelmente relacionados, e garantir que as famílias em
sofrimento sejam encaminhadas a serviços de saúde mental, nos quais as pessoas
têm experiência com o estresse traumático.
"Enquanto pais, queremos a segurança dos nossos filhos.
Depois que você passa por isso, sabe que eles nunca estarão 100% seguros, e não
é fácil parar de pensar nisso", declarou Kassam-Adams.
* Perri Klass é médica pediatra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário