Heloísa Noronha
Do UOL, em São Paulo
Pais não precisam esconder problemas das crianças, mas não
podem esperar delas amparo
Por causa das relações familiares mais informais, é comum que muitos pais
conversem sobre tudo com os filhos, seja qual for sua faixa etária. Nem sempre,
porém, as crianças estão preparadas para lidar com determinados assuntos e
preocupações do mundo dos adultos. Saber ponderar a maturidade emocional dos
filhos, o conteúdo do que é dito, a forma como as coisas são faladas e,
principalmente, não transformá-los em confidentes são algumas das atitudes que
os pais devem ter para preservá-los.
"Nossas questões pessoais não devem se tornar um peso
para eles", afirma a psicóloga Cecilia Russo Troiano, de São Paulo (SP),
autora do livro "Vida de Equilibrista – Dores e Delícias da Mãe que
Trabalha" (Ed. Cultrix). "Filhos não são conselheiros. Eles precisam
sentir que os pais são sua fonte de apoio, e não o contrário. Antes de serem
amigos, são pais e filhos. Amizades eles terão com muitas outras pessoas na vida,
mas o vínculo mais importante apenas os pais podem dar", afirma a
especialista.
O fato é que mesmo que certas coisas não sejam ditas explicitamente, os filhos
captam se os pais estão felizes ou tristes desde a mais tenra idade. Isso não
significa, porém, sinal verde para compartilhar tudo abertamente com eles.
"Mas, às vezes, falar sobre o que está deixando os pais tristes é
positivo, já que a criança pode ter a fantasia de que algo ruim está
acontecendo por culpa dela. Saber que a tristeza vem de outras fontes pode ser
um alívio", diz Cecilia.
Porém, a ideia não é pedir colo para as crianças, já que são elas é que
precisam de amparo. "De novo, vale a regra do bom senso: não esconder
sofrimentos, mas tampouco usar o desabafo aos filhos para que eles sirvam de
fonte do conforto ou atuem como conselheiros", declara a psicóloga.
De acordo com a psicóloga clínica e psicoterapeuta Triana Portal, de São Paulo
(SP), não há nada de errado em comentar com os filhos que se está com problemas
no trabalho, que o pagamento atrasou, que a família vem atravessando
dificuldades financeiras, que naquele dia acordou de mau humor.
"Essa situações devem ser compartilhadas até para ensinar senso de
responsabilidade, valores, de mostrar que a vida é bela mas tem suas mazelas,
que não podemos ter tudo o que desejamos no momento em que desejamos. É
importante que os pais aproveitem as questões cotidianas para ensinar lições de
vida", fala a especialista.
Filtre as informações
Há uma linha tênue entre o que a criança consegue lidar e o
que não, por vários fatores: maturidade da criança, tipo de criação, se há
problemática concomitante... De modo geral, porém, não devemos subestimar as
crianças achando que elas não ouvem, não enxergam ou que são tolas –daí a
importância de prestar atenção na forma como se diz as coisas.
"Conheço pais que discutem problemas abertamente na
frente dos filhos e acham que eles não sabem de nada do que acontece ou que não
estão entendendo. Isso é uma agressão velada. A criança fica isolada, mas por
entender que as coisas não vão bem, sofre em silêncio com um perigo que, muitas
vezes ,ela imagina ser maior do que realmente é", afirma Triana Portal.
A questão da segurança emocional é fundamental na formação da personalidade da
criança. Omitir um problema não significa preservar. Quando o movimento é de
manter os filhos distantes, o resultado é uma distância também na relação. Um
bom exemplo é quando um dos pais perde o emprego, uma situação triste que
desencadeia uma angústia familiar que dificilmente escapará às "antenas
infantis". É necessário comunicar o fato à criança, mesmo que doa, mas
devemos fazê-lo com honestidade e tranquilidade.
"Uma boa sugestão é falar à criança que ela não precisa se preocupar,
porque os pais vão dar um jeito de resolver tudo, e que ela deve continuar
cumprindo suas tarefas. E que os problemas dela não são esses, mas, sim,
brincar na escolinha, obedecer o papai e a mamãe etc.", fala a psicóloga e
psicopedagoga clínica Ana Cássia Maturano, de São Paulo, coautora do livro
"Puericultura – Princípios e Práticas (Ed. Atheneu).
Frases com ameaças e comparações prejudicam o
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Ao perderem a paciência ou quererem demonstrar o enorme
afeto pelo filho, alguns pais deixam escapar frases que têm impacto negativo no
desenvolvimento das crianças. A seguir, três especialistas analisam as nove
mais comuns | Por Priscila Tieppo - do UOL, em São Paulo Doki/Arte UOL
E como filtrar as informações? Se o chefe está pegando no pé
de um dos dois, por exemplo, não precisa dizer isso para os filhos. "Mas
se as crianças perguntarem por quê estão chateados, não há nada de mau em
responder que estão assim porque o chefe não foi muito legal no trabalho, mas
que nem por isso é necessário que se preocupem", comenta Ana Cássia.
Problemas financeiros também não devem ser omitidos, pois é essencial que a
criança esteja a par da situação da família –e, mais uma vez, os adultos devem
acalmá-la explicando que se trata de algo temporário. De acordo com a
psicopedagoga, os pais não precisam levar dilemas de um universo maior para a
criança, como "sua avó fez um exame e deu uma pequena alteração" ou
"seu tio está deprimido", porque são questões que não a atingem de
uma forma direta.
O ideal é fazer um resumo da história, tirar os excessos e as palavras pesadas
e evitar o pessimismo. Além disso, antes de falar com seu filho, faça um
exercício: imagine-se como criança, ouça a história que pretende contar como se
fosse você ouvindo e avalie como se sentiu. "Você conhece seu filho, pense
bem, não aja por impulso. Se for com tato saberá o que deve dizer. E se hora ou
outra se exceder, não se culpe: pais erram, são humanos", diz Triana.
Problemas de casal
Caso os pais estejam com um problema na relação de casal,
não devem expor o conflito. É um erro falar mal do marido ou da mulher com o
filho, procurando transformá-lo em cúmplice. Em seu desenvolvimento social, as
crianças pequenas tomam para si os problemas pessoais dos pais e acreditam que
elas são a razão das brigas entre os dois. Então, cuidado.
E os adultos também devem prestar atenção à maneira como
lidam com a rotina. "O pai que chega em casa todo dia reclamando do
trabalho e do cansaço e dizendo que o fim de semana não chega nunca vai passar
ao filho a ideia de que trabalhar é algo negativo. Os pais nunca devem fazer
isso, pelo contrário, o ideal é procurar transmitir o lado positivo dizendo,
por exemplo, que foi elogiado ou que fez determinada realização", diz a
psicóloga Maria Rocha, de São Paulo (SP).
"Um adulto que só reclama, murmura, coloca nos
problemas um peso muito grande e só vê obstáculos vai interferir na visão de
mundo das crianças, que também vão agir dessa forma negativa quando tiverem
problemas", completa.
Você projeta seus desejos no seu filho?
Os pais esperam que seus filhos sejam felizes e
bem-sucedidos. Por isso, é natural projetar neles alguns de seus sonhos, como
cursar certa universidade. Descubra como você lida com esse tema | Consultoria:
Anne Lise Scappaticci, terapeuta familiar